sexta-feira, julho 07, 2006

Aprendendo a jogar

Como estou sem tempo, sem dinheiro e sem internet, vou postar aqui a cartinha que mandei para minha querida amiga Anne. Ela não difere muito do que eu escreveria, caso fosse um post, na assepção correta da palavra. Afinal de contas, minha vida é um site aberto. Ah, e please, não reparem nos erros, nem na falta de coerência. Eu sou humana, pô.

Querida Amiguinha Anne

Neste meio tempo, desenvolvi uma nova categoria comportamental. Se, nas últimas semanas, dei mostras de que seria a próxima pós-doutora no assunto "Cagando e Andando: configurações de uma identidade em movimento frente à sem-noçãozice alheia", agora estou tentando fazer um desdobramento teórico-prático no sentido de desenvolver uma nova modalidade: "Cagando e Sambando".

Pois é. Como se não bastasse dar só uma cagadinha, e ir caminhando, agora eu cago e dou uma sambadinha. Não é ótimo assim??? Um dia ainda ganho o nobel.

Bem, vou tentar ser suscinta. rsrs

Quando voltei de Recife liguei pro Everton pra ir me buscar no aeroporto, e ele, todo fofo, ficou esperando 1h pq o vôo atrasou, e nem cobrou hora de espera. Papinho pra lá e pra cá, aquela coisa, e, de repente, ele me faz um pequeno elogio (algo como "vc é linda"). Fiquei encabulada, mas como ele falou meio que do nada, passou, e continuamos conversando na boa. Fiquei encucada. Será que ele estava me dando um molinho? Pq ele é bem bonitinho, além de educadíssimo, simpático, fofo e tem voz bonita e mão grande e é altíssimo. Aliás, quando eu fui pra Recife, e ele foi me levar, eu, nessa simpatia recorrente, dei um abraço nele, e sabe quando é aquele abração, daqueles de corpo todo colado, apertado? Foi assim. Molinho? Será?

Eu conheci o Everton no segundo dia em que encontrei com Beto, aquele negão sem-noção, cantor sem talento, compositor sem contatos, lá no Pelourinho, e tinha decidido que não ia pra casa dele. Ele insistia, óbvio, e eu que não tava a fim de dar pra nenhum negão sem-noção, por mais gato que fosse, resolvi me mandar. Tava tarde, e fui pegar um táxi. O mais legal foi que o Everton fez um caminho diferente, que saiu bem mais barato do que me era cobrado, no percurso Pelourinho-Ondina. Anotei o telefone, afinal, é sempre bom ter o contato de um taxista amigo, honesto e gato.

Quando liguei pra ele me levar pro aeroporto pra eu ir pra Recife, às 5h da manhã, ele prontamente lembrou de mim, foi super simpático, e estava aqui, pontualmente. Fofíssimo. Eu ainda por cima esqueci minha jaqueta branca em casa (jaqueta esta que não foi usada durante nenhum dos dias que passei em solo pernambucano), e ele voltou, tranquilamente, e ainda se ofereceu pra subir pra pegar. Foféssimo. Aí, no carro, comentei que queria conhecer o bendito Beco de Gal, aquele que rola um sambinha durante a semana, que a gente tava tentando ir desde setembro, lembra? Ele disse que ia me levar um dia. Achei que era caô. Ok.

Na volta de Recife, ele refez o convite pra gente ir pro pagode, mas eu não podia pq tinha que estudar. Perguntei se rolava semana que vem. Ele disse que tava tudo bem. Mas achei que ele realmente estivesse apenas querendo ser simpático. Adicionei o taxista em questão no orkut (taxista cibernético), e a primeira msg que ele mandou foi: "E aí, quarta tá de pé?" Fiquei feliz, mas encucada. Das 3 uma: ou ele é fofo e amigo mesmo, e vai me levar na boa, ou ele quer me comer, ou ele vai me levar de graça e vai querer cobrar a volta. Eu sou insegura, vc sabe. Mas confesso que a segunda opção me animava. Liguei e combinamos, 22h30, ok, passo lá pra te pegar. Fofo.

22h, começou a cair um toró. Achei que era um sinal pra não ir, que eu ia me ferrar. Ainda por cima eu estava um pouco bolada por causa de um certo habitante do continente africano, que definitivamente resolveu romper o acordo bilateral Brasil-Angola, e não saía do quarto há dias. Quando saía, falava um "oi" muito mal falado, e olhe lá. Resolvi não ir mais, a lei do retorno poderia se confirmar mais uma vez e eu ficar na pista. Liguei pra Everton, perguntando se ia rolar, afinal, estava chovendo. Ele disse que já estava vindo (fofo!) e ia passar lá na frente da parada pra ver, e ia me ligar. Passou um tempo, eu já estava me preparando pra deitar, crente que ia levar um bolinho básico. Neste exato momento, ouvi um barulho de carro. Quando olho pela janela, vejo aquele táxi belíssimo, branco, lindo, chegando, passando pelo portão e parando aqui em baixo do prédio. Tipo Richard Gere em "Uma Linda Mulher", meu príncipe encantado chegada em seu cavalo branco. Literalmente. Corri e passei rímel, o apetrecho mais importante, e já ia descendo, quando percebi que ainda estava de calcinha. Voltei pra vestir minha calça (branca, pra combinar com o táxi, ideal para uma noite chuvosa). Quando abri a porta pra sair, quem estava lá paradinho me esperando no corredor?? Fofo!!! Bora pro pagodão, o reino encantado dos negões salvadorenhos.

Chegamos lá, ainda chovendo, eu já querendo voltar, na certeza absoluta, depois de tantas furadas, que aquela seria mais uma. Imaginei que talvez ele fosse embora e me largasse sozinha, ou que resolvesse descontar o preço da corrida em cerveja. Lêdo engano. Entramos, de GRAÇA, pq ele conhece o povo todo de lá, me apresentou pro pessoal, e pra Gal, dona da parada, simpaticíssima, que graças a Deus, resolveu pôr uma cobertura em seu recanto bucólico, evitando assim que Lulu umidificasse suas tranças de 100% kanekalón.

Sentamos lá em cima, com váááários negões interessantes chegando (não em mim, devido ao meu acompanhante). Começou o pagodão, e pasme - vários sucessos da nossa adolescência. Só não digo todos pq faltou capricho no pout-pout-rri (sei lá como se escreve essa porra) do Exaltasamba. Aliás, tocaram só umas duas deles. Mas foi lindo o momento Art Popular, bem como a homenagem ao Negritude, tocando, inclusive, "Conto de Fadas". Gozei.

Everton todo solícito, gentil, atencioso. Conversando papos corriqueiros. Até aí, nenhum climinha mais erótico-romântico, só amizade. Só que eu estava feliz, feliz, feliz. Então, eis que surgem umas amigas dele. Uma loira véia, uma morena cheia dos decotes e apliques, e outra barriguda peituda feia e antipática. A do decotão era a mais simpática, foi me dando um abraço generoso logo na entrada, com aquele caloroso afeto soteropolitano que quase me sufocou entre seus seios fartos. A loira passou ao largo, e a peituda me deu aquela olhada de cima abaixo, como vc bem pode imaginar. M.E.D.O. Constrangida, não tentei me enturmar, e fiquei na minha, ouvindo os grandes sucessos de Leandro Lehart. Mas logo a decotadona começou a dançar, e me chamou pra sambar com ela. O pagodão comendo, me empolguei. Descobri que ela era ex-dançarina de axé, então vc pode imaginar as coreografias e rebolados. Adorei (depois te passo os passinhos novos).

Nisso, a barriguda foi se chegando... E senti a pontada fina do recalque quando ela introduziu: "Ah, eu sabia que o Everton ia te trazer aqui, ele me disse segunda quando a gente saiu, porque eu sou namorada dele..." Segurei a peteca, vc sabe, eu não caio do salto fácil. Não esbocei surpresa, o que deu uma quebrada nela logo de cara. Mas a lutadora de sumô não se deu por vencida. "Você sabia que ele tem 3 filhos?" Eu: "Ah, é?? Eu vi a foto do filho dele, que é a criança mais linda do mundo"(realmente, eu vi a foto do pequerrucho no orkut), e dei os parabéns a ela pela prole. Mais sem graça ainda, ela disse que não era mãe "dur mininu naum..." E arrematou que, na verdade, eles não eram nem namorados, só estavam ficando. Eu, meiga, desejei toda a felicidade do mundo para os dois, que eles formavam um belo casal, e que eu esperava que ela desse a ele filhos tão lindos quanto os anteriores. Aí ela finalizou dizendo que, na verdade, eles estavam brigados. Hum, sei. E que eles estavam meio separados. Ah, tá. Mas que, se deus quiser, eles iam voltar. Amém. E fui sambar. Skidum, skidum.

Passou um negão pela nossa mesa. Everton tava meio afastado, conversando com um conhecido. O negão passou e deu aquela piscadela do mal pra mim, aquela que vc bem sabe como é. Ela viu, e veio correndo. "Ah, vc viu, menina?? Que beleza, hein?? Olha, vou pegar o teu telefone, pra vc sair com a gente. Eu gostei de vc. Vc vai ver, vou te arrumar um negão muito gato, e blá blá blá". Insistiu que adorava o Everton, que ele era o cara mais lindo do mundo pra ela, mas que Deus ainda ia me ajudar a encontrar o meu. Ou seja, além de me ameaçar, agora ela estava tentando me cafetinar?? Ótimas estratégias. Já de saco cheio, fiquei na minha, escutando e sorrindo fofamente, pra evitar maiores constrangimentos. Ela falando baixo, pra tentar me coagir. Aí Everton veio, ficou do meu lado, sorriu e começou a dançar comigo. COMIGO. C-O-M-I-G-O.

Rá.

Confesso que até então, eu realmente evitei ficar muito perto dele. O medo paralisa um ser humano, Anne. Fiz uma limpeza dental antes de viajar que me custou 80 reais, não queria perder minha arcada assim, de uma hora pra outra. Além disso, a night tava ótima, eu não queria me estressar. Realmente, não estava rolando nada, xaveco nenhum. Óbvio que mulher sabe quando o macho está em perigo, mas o que eu posso fazer se, além de feia e boba, ela é chata? Eu tava muito na minha, e, independente de fazer ou não alguma coisa, ela já tinha perdido a parada há tempos.

E eu sambando mais que mulata do sargentelli.

Neste exato momento, vi, pelo rabo do cantinho do olho esquerdo que ela tinha tentado segurar a mão dele, e ele tinha sartado de banda. Rá. Aí, neste outro segundo exato momento, a Gal, dona do Beco, e também cantora, pegou o microfone, e, após cantar aquela da Alcione, do negão de tirar o chapéu, apontou pra mim e me fez uma pequena homenagem, já que era a minha primeira vez lá, e que ela ficava muito feliz dos "cariocas" prestigiarem o local. Todos me aplaudiram. Rárá. A inveja tomou conta da barriguda. Perguntou como eu conheci o Everton, e quando eu ia embora ("daqui a dois anos, filhota" rárárá). Aí ela apelou pra violência moral. "Sabe a minha colega ali? (e apontou a loira véia, que sambava pior do que uma salamandra perneta) Ela ficou te olhando torto, pq ela achou que vc estivesse dando em cima do Everton." Fiquei bolada. Até porque não imaginei que aquele olhar torto fosse por causa de uma antipatia, e sim por conta de algum estrabismo congênito. Me irritei. Respondi que ela podia olhar torto à vontade, pq nós éramos só amigos. A mentira enobrece o homem. Aí ela defendeu a loira véia, que ela era legal, que elas eram muito amigas. Por via das dúvidas, saí de perto da loira véia, pra evitar o mau-olhado. Depois dessa noite, se eu voltasse lá na rezadeira de Caruaru, tadinha, ela ia ter um trabalhão pra me limpar das vibrações pestilentas. Então, saí de perto da loira véia e cheguei bem pertinho de Everton, que, carinhosamente, me acolheu em sua companhia. Eu gosto do perigo.

A noite passou, mas a pançuda sempre dava um jeitinho de se entrepor entre nós dois. Esse tipo de competição me cansa, sabe? Além do mais, pra quê lutar, quando a batalha já está no papo? Mas porra, pra que tanta picardia adolescente, entre duas mulheres velhas e maduras? Aliás, ela era BEM mais velha, e não diria madura, propriamente. Graças a Oxalá, a loira véia esqueceu de mim e foi dar em cima de um paraíba cabeçudo lá, afastando da minha pessoa as energias pesadas e negativas. A ex-Sheila Carvalho anotou meu telefone, pra me convidar para uma mariscada (árgulis). Eu disse que ia, claro. Adoro marisco.

Mas confesso que, por um momento, visualizando um futuro de noitadas regadas a axé e pagodões, com negões lindos rodopiando ao meu redor, por um instante, apenas, cogitei a possibilidade de largar Everton pra lá, e investir fundo nestas novas amizades. Mas o olhar torto da loira véia me empurrava na direção contrária. Aí Everton sentou, e puxou uma cadeira pra mim. Naquele instante, pelo cantinho do globo ocular, percebi que tal qual uma dança das cadeiras, a outra ia tentar correr na minha frente pra sentar no meu lugar. Mas eu, sagaz como um mini-calango-ninja corri e sentei. Yes. Everton, carinhoso como sempre, perguntou se eu já queria ir embora, pq ele me levaria. Fofoooo. Eu não queria incomodar, mas ele insistiu. Resolvi fazer intriga: "Everton, mas a sua namorada ali disse que vc ia levá-las em casa. Não quero te atrapalhar". Aí ele, tal qual o príncipe mais encantado do mundo. "Lu, eu vim com vc. Minha prioridade é vc." (suspiro) "Então tá, né? Vamos ficar até o fim?", perguntei prontamente, quase batendo palminhas, e ele, lindo, concordou, solícito. Bora continuar sambando (e cagando). Aí minha arqui-inimiga-rival-barriguda começou um pequeno rebuliço, incomodada com o fato dele ir me levar. Eu, fingindo inocência, caguei. Ela queria ir junto me levar, pra depois todo mundo ir pra casa com ele, afinal de contas, além de querê-lo como namorado, pq não aproveitar pra fazê-lo de burro de carga? Mas Everton foi firme, como só o grande Hércules frente à Hidra de Lerna conseguiria sê-lo. Na hora de ir, fui me despedir dela. Dois beijinhos, ela, visivelmente contrariada, deixou escorrer algumas gotas verdes da baba venenosa do ciúme e do rancor, que aproveitei pra limpar no cabelo de interlace da ex-dançarina de axé. Me despedi de longe da loira véia.

E puta que pariu, ele beija bem pra caralho. Até o final do meu mestrado, eu ainda vou levar porrada na rua.


Ah, e a calça tá toda suja. É só botar na água sanitária que sai?


Beijo grande, amiga.


P.S.: Como eu ainda não tinha certeza se ia rolar a pegação, quando ele foi me deixar em casa, subi correndo, rapidinho, pra pegar um chaveirinho de boi-bumbá que eu comprei em Recife pra vc e dei pra ele, tá? Vc não vai se importar, né, amiga? Foi por uma boa causa.